quarta-feira, 27 de março de 2019

Para Sempre Sherlock Holmes...


Essa eu não vi ninguém comentar em português, então acho que cabe a mim (aliás, que bom que não vi pois foi uma surpresa deliciosa).

Lá estava eu assistindo ao belíssimo Mr. Holmes, de Bill Condon, uma das mais tocantes obras a seguir a tradição literária/cinematográfica de explorar as lacunas do cânone oficial sherloquiano, no caso o período da aposentadoria do detetive, posterior à Seu Último Adeus (cronologicamente o "último" conto de Sherlock Holmes escrito por Arthur Conan Doyle) quando me deparo com a cena em que o octagenário Holmes de Sir Ian McKellen vai ao cinema, sozinho e incógnito, assistir a uma das primeiras versões cinematográficas de suas aventuras.

A cena já é inspirada por si só, um verdadeiro curto circuito metalinguístico, mas ainda tem um sabor a mais quando nos damos conta de que o ator que interpreta o Holmes no filme dentro do filme é ninguém menos que Nicholas Rowe, o "Jovem Sherlock Holmes" de O Enigma da Pirâmide, um dos maiores clássicos de "Sessão da Tarde".

Mais do que outra camada conceitual, essa breve aparição possui ares de justiça simbólica. Ainda que seja mundialmente famoso (e querido) por sua performance como o Jovem Holmes, o fato é que Rowe é conhecido única e exclusivamente por esse papel. Ainda que o IMDb liste uma série de outros trabalhos, não há nada que chegue sequer perto da relevância no filme de 1985.

Suponho que as mesmas características físicas totalmente fora do padrão de beleza masculina que, nos anos 80, o ajudaram a se tornar a escolha ideal para encarnar um Holmes adolescente, se revelaram uma barreira intransponível para qualquer esperança de estrelato hollywoodiano, independente do sucesso do longa de Barry Levinson.

Pensando bem, talvez reaparecer depois de tantas décadas justamente como Holmes devesse ser encarado mais como a confirmação de uma maldição (e talvez até uma aceitação de sua própria parte) do que justiça simbólica... Ou talvez as duas coisas juntas, intercambiáveis e ambíguas, como quase tudo no volátil universo dos bastidores do cinema. De qualquer forma, é mais uma pequena grande nuance para o longa de 2015 e um calorzinho melancólico no coração...


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