terça-feira, 8 de setembro de 2020

É só Iluminação...


"Eu acho tão superestimado. Todo mundo adora 
Val Lewton por conta de um par de cenas... a cena da piscina, por exemplo, por que? Não há nada perto dela, é só iluminação, nada vai pega-la! É assustador quando tem algo por perto. Jurassic Park feito por Val Lewton não seria nada!" declarou o mestre John Carpenter no documentário A History of Horror, provando que até mesmo grandes cineastas podem falar besteira de vez em quando.😜

O engraçado é que "adorado por conta de um par de cenas" é algo que facilmente poderia ser dito sobre Halloween se a sua intenção for ser ranheta (ou se você for fã do Rob Zombie, sei lá). Não há como negar que o primeiro grande clássico de Carpenter tem tudo a ver com o estilo dos filmes produzidos por Lewton para a RKO nos anos 40. Afinal, na maior parte do tempo, Michael Myers é só uma sombra (the shape), uma ideia insinuada na imaginação do público pela mise en scène. Uma vez estabelecida, essa "presença" não precisa ser mostrada para que a platéia a "veja" em cada canto da tela, assim como a pantera que espreita Jane Randolph na cena da piscina de Sangue de Pantera.

É essa aposta na potência da sugestão, na participação ativa do público preenchendo as lacunas, que torna Cat People e Halloween obras tão marcantes, filmes que não apenas permitem como EXIGEM que a platéia seja co-autora, "criando" a pantera, "criando" Michael, pouco a pouco, até o grande clímax, quando o horror se revela naquele espaço misterioso entre a tela e o inconsciente de quem assiste.

É uma aposta arriscada, porque o espectador sempre pode se recusar a jogar: "Ah, não tem pantera nenhuma!" ou "Ah, é só um dublê com máscara de Capitão Kirk!" e pronto, fim do jogo. Faz parte, o chato é essa recusa partir justamente de um diretor como Carpenter, menosprezando um dos mais importantes ciclos da história do cinema de horror (e, por tabela, diretores como Jacques TourneurRobert Wise e Mark Robson) com argumentos dignos de um adolescente comentando no filmow.

Não deixa de ser um lembrete de como apreciação artística tem muito mais a ver com predisposição do que com qualidade. Que "é só iluminação" é fato. Dizer isso com menosprezo ou com admiração é uma escolha.😉


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