Dellamorte Dellamore (1994) não é bem um filme de horror, mas uma estranha e surreal comédia macabra que nunca deixa de soar também perturbadora.
Talvez uma melhor classificação fosse o nosso bom e velho realismo fantástico ou realismo mágico, a la Gabriel Garcia Marquez (mas você pode chamar de dark fantasy, se te parecer mais descolado😜).
Baseado no romance de Tiziano Sclavi, criador do lendário Dylan Dog, o filme tem uma trama episódica que vai pouco a pouco se tornando mais delirante. Os mortos caminham, mas ninguém parece achar assim tão estranho. Os fogos-fátuos deslizam pelo ar com naturalidade enquanto o coveiro Francesco Dellamorte tenta encontrar o amor em meio aos túmulos e a rotina de enterrar e abater os mortos (necessariamente nessa ordem), sem se dar conta de que sua ideia de amor talvez seja ainda mais irreal do que o mundo fantástico que o cerca.
Veterano nas mais diversas funções em filmes de Lucio Fulci e Dario Argento desde os anos 70, Michele Soavi já havia se provado como o último dos grandes diretores do período áureo do horror italiano com obras como o surpreendente slasher cênico O Pássaro Sangrento de 1987, o desvairado A Catedral de 1989 (sem dúvida a mais insana adaptação de M.R. James que você poderia imaginar) e o injustamente mal lançado horror satânico lovecraftiano A Filha do Demônio de 1991.
Mas Pelo Amor e Pela Morte (também conhecido internacionalmente como Cemetery Man) vai muito além de um exercício eficiente de gênero ou mesmo uma releitura espirituosa e tardia para o ciclo de zumbis italianos oitentista. É um filme engraçado e triste, ocasionalmente angustiante, onde cada mudança de cena te pega de surpresa com uma imagem inusitada da mais estranha beleza.
Talvez seja um dos filmes mais refinados de todo o fantástico italiano e, pra todos os efeitos, um encerramento com chave de ouro de toda uma era. Ainda que se produzam filmes de horror na Itália até hoje, nada se compara ao que o cinema gótico e o giallo foram para o cinema italiano nos anos 60, 70 e 80. Como Francesco, Soavi executa com dignidade o papel de coveiro de toda uma forma de se fazer cinema.
Não sem derramar uma lágrima ao apertar o gatilho... sete dias depois da última pá de terra.🥀
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