Topei com um texto na internet uma vez, não lembro onde, que defendia que só se deveria escrever críticas quando se tem algo de bom a dizer sobre o filme (ou livro, ou peça, ou série, ou...), caso contrário era mais sensato simplesmente não escrever nada. E arrematava: "É sempre melhor gostar do que não gostar".
Na época achei um tanto absurdo... tipo, claro que é melhor gostar, mas pra isso é preciso que seja bom, não é? E, particularmente, eu nunca menosprezei a atividade crítica, sempre a considerei fundamental para o refinamento do que costumamos chamar de "gosto pessoal". Defender que não se deve falar mal de uma obra parecia apenas uma variação daqueles velhos preconceitos contra críticos, algo bem de senso comum.
Mas, refletindo hoje, parece fazer mais sentido pra mim.
Quantos obras interessantes (especialmente as mais incomuns, experimentais ou fora do esquema) deixam de ser conhecidas porque alguém que não gostou do que viu decidiu escrever a respeito, e esse alguém, por acaso, tinha um veículo de largo alcance à disposição?
(Levando em conta que, hoje em dia, um veículo de largo alcance pode meramente ser um blog, um canal de youtube ou um perfil nas redes sociais.)
Será que a possibilidade de poupar pessoas de "perderem tempo" com "filmes ruins" compensa o risco de afugentar um público que teria visto na obra coisas que quem escreveu, naquele momento, não viu?
Não seria mais rico focar a atividade crítica em incentivar pessoas a verem obras ditas como boas ao invés de desestimular a ver obras ditas como ruins?
Tantos críticos gastam tempo e trabalho destruindo obras que detestaram quando poderiam usar esse mesmo tempo e energia recomendando obras que amaram.
Fiquei pensando nisso ao rever Dracula (1979), o "remake" que a Universal produziu de seu clássico de 1931, dirigido por John Badham, com Frank Langella no papel principal.
Quando eu era moleque li uma resenha extremamente venenosa numa edição da Revista Wizard Brasil. O resenhista tratava o filme por "essa coisa", recomendando veementemente que ninguém perdesse tempo com tal porcaria.
Eu acreditei... e evitei o filme por anos e anos. Quando finalmente resolvi dar uma chance... tornou-se uma das minhas versões favoritas!
Dracula (1979) é notável em muitos aspectos. É fato que Langella é um Drácula no mínimo incomum (deliciosamente cafona, o que talvez não agrade todo mundo) e o roteiro (que é baseado não no livro mas na peça de Hamilton Deane e John L. Balderston) nem sequer tenta seguir o enredo original, coisa que arrepia os mais puristas.
Mas o que interessa é que o filme é visualmente belíssimo, com uma fotografia acinzentada e lúgubre (mais a respeito disso abaixo) e inúmeras cenas que conseguem ser realmente assustadoras (o que não é tão comum em filmes de vampiro, especialmente dos anos 80 em diante).
Como exemplos, temos a arrebatadora cena de abertura à bordo do Demeter, abrindo o filme de forma chocante e brutal. Drácula deslizando as paredes da mansão como uma grotesca lagartixa (o detalhe das unhas arranhando a janela é particularmente creep). O encontro de Van Helsing com a vampirizada Mina nas catacumbas sob o cemitério. E a surpreendente morte do conde, uma das mais criativas e impactantes da história do cinema, ouso dizer. Sem contar a trilha super reconhecível de John Williams e a atuação dos lendários Lawrence Olivier e Donald Pleasence.
Uma obra-prima? Não, também não seria pra tanto, mas para reduzi-lo a nada mais do que "essa coisa" o crítico precisou focar toda a sua atenção naquilo que poderia ser tomado como "ruim" e desconsiderar tudo que poderia ser avaliado como "bom"... o que, no fim, é uma escolha, uma prerrogativa de quem vê... e de como vê. Uma escolha que pode nos acrescentar algo... ou não... uma escolha que pode levar outros a se aventurar em territórios desconhecidos... ou não.
Nessa epifania, finalmente entendi o significado de "é sempre melhor gostar do que não gostar" e, baseado nesse princípio, vou escolhendo os tópicos sobre os quais escrevo por aqui.
Foi-se o tempo em que o director's cut era automaticamente considerado a melhor versão de um filme (oi, George Lucas!). Hoje ninguém mais seria recriminado ao afirmar que um grande diretor do passado ficou tonto depois de velho (beijo, Ridley Scott!) e cagou a sua obra-prima para as novas gerações.😣
Mas é importante lembrar que cada caso é um caso, e ao menos tentar avaliar de forma desapaixonada mudanças que, num primeiro momento, possam nos parecer absurdas e inexplicáveis, como quando John Badham "descoloriu" o seu Dracula de 1979. Um caso pioneiro de um director's cut amplamente rechaçado.
Choveram fan edits internet afora tentando "consertar" as cores dos releases disponíveis. E eu entendo. O choque era, de fato, grande. Eu mesmo guardei um release desses por anos até que me dispus a entender porque John Badham insistia tanto em resgatar a palheta que o estúdio antes havia rejeitado.
E o motivo é simples: o Dracula (1979) com cores dessaturadas é um filme de visual único e deslumbrante! Não que houvesse algo de errado com o technicolor da versão de cinema, só não tinha nada de especial. Era lindo, como a fotografia da Hammer Films que o inspirou. Mas esperado e, enfim, bem comum.
Com o novo look, os aspectos macabros se acentuaram e acharam um ponto de equilíbrio melhor com o romantismo do roteiro. O caráter em si mudou. Tornou-se mais ambíguo e desconfortável. Já não era mais uma versão tão facilmente rotulável como melosa e piegas. Dracula (1979) nunca havia sido tão terror.
Ainda assim, é como se diz: uma vez lançada, a obra não pertence mais ao autor e sim à audiência. Quem não tolera o Dracula (1979) que o John Badham prefere, já pode contar com o release da Shout Factory, que trás ambas as versões, "colorida" e "descolorida". Eu, particularmente, já fiz minha escolha.
Eis duas chamadas que gravei desse que é um dos meus filmes favoritos de terror: https://youtu.be/dZ7WYymNYTs
ResponderExcluirNa tv aberta brasileira, estreou em 1986, na Globo, no “Festival de Verão”, foi qdo o vi pela 1a vez!
Revi ainda nos anos 80, nos anos 90, em 2001, e em 2015!
Tema majestoso, e ainda: ótima trilha, roteiro, visual, elenco, locações, direção de arte, clima e um final épico!
Histórico, atualizado, que montei do filme na tv aberta brasileira:
1986 – 18/02 – 4ª – 22:25 – GLOBO – FESTIVAL DE VERÃO
1988 – 23/07 – SÁBADO – 03:50 – GLOBO – CORUJÃO
1994 – 29/12 – 4ª – 02:10 – SBT – XXXXXXXXXX
1995 – 28/10 – SÁBADO – 13:30 – SBT – CINEMA EM CASA
1997 – 31/10 – 6ª – 02:35 – SBT – FIM DE NOITE
2000 – 28/05 – DOMINGO – 02:10 – GLOBO – CORUJÃO
2001 – 03/10 – 4ª – 01:55 – GLOBO – INTERCINE
2003 – XX/XX – XXXXXXXX – XX:XX – GLOBO – INTERCINE
2004 – 30/10 – SÁBADO – 02:50 – GLOBO – CORUJÃO
Esse filme é tão legal! Não sei por que tanta gente detesta, são uns chatos! Rs!
ResponderExcluirQuero ver alguém ter coragem de falar que detesta na minha frente.😅
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