quinta-feira, 29 de agosto de 2019

Se Baseado em Fato é...


Da tradição gótica literária emulando diários, relatos e registros como estratégia de suspensão de descrença até o estabelecimento da verossimilhança como paradigma dominante da narrativa cinematográfica, não há gênero mais apegado à tag "baseado em fatos reais" do que o horror.

E eu diria (ainda que contrarie o senso comum) que o gênero sempre perdeu muito por conta disso, limitando o potencial imagético do fantástico às bem delimitadas fronteiras da mera credibilidade.

Mais que isso, o lastro com uma suposta "realidade" tende a tornar os autores um tanto preguiçosos, afinal porque livros, filmes ou séries precisariam se preocupar com enredos criativos e estéticas cuidadosas se só estão objetivamente relatando "fatos"? Basta o feijão com arroz básico, afinal o envolvimento do público já está garantido de antemão, independente de méritos artísticos (pseudo-docs como Paranormal Witness e Ghost Hunters são meio que casos extremos).

De fato, não há outra razão para que uma franquia tão medíocre quanto Amityville se mantenha viva por 40 anos, com a inacreditável marca de 28 filmes, entre produções de cinema, TV, docs, prequels e remakes. Tudo sustentado até hoje por uma vaga e duvidosa sucessão de "fatos reais" trazida a público pela primeira vez no livro de Jay Anson.

Antes, porém, que me acusem de quebrar minha própria regra de só tomar como pauta obras sobre as quais eu tenha algo de bom a dizer, deixe-me afirmar que fui positivamente surpreendido ao rever o The Amityville Horror original de 1979 por ocasião do aniversário de lançamento. Lembrava dele como um filme morno, até tedioso, uma "lenta preparação para algo aterrorizante que nunca acontece", segundo muitos críticos, e meio que é mesmo, mas pela primeira vez encarei isso como algo positivo, um bom uso da lógica do "Based on a True Story" para desenvolver um horror que não está nos poucos momentos sobrenaturais supostamente "reais", mas na sua reverberação pela sóbria narrativa de Stuart Rosenberg e nas sutilezas de atuação de James Brolin e Margot Kidder. Pode não ser muito, mas não deixa de ser digno para o mais famoso dos filmes de horror "baseados em fatos reais".

E o dog ainda sobrevive! 😉



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