Certos filmes parecem crescer dentro de nós conforme o tempo passa, mesmo (ou especialmente) quando a primeira impressão foi morna ou até negativa (o contrário também acontece, claro, e como).
A Colina Escarlate, de Guillermo Del Toro é um caso emblemático pra mim, afinal tinha tudo para eu me apaixonar a primeira vista, mas não foi o que aconteceu. Talvez porque tenha mesmo defeitos difíceis de abstrair num primeiro momento. Afinal, aumentar repentinamente o volume da trilha pra forçar jumpscares baratos já é intolerável por si só, quanto mais num projeto que intenciona emular o horror gótico ao estilo vintage, assumidamente inspirado na obra de Mario Bava. Soa como unhas arranhando lousa, não dá pra fazer vista grossa, mesmo sendo do Del Toro.
Porém, a extraordinária beleza da fotografia, figurinos, cenários e, claro, do elenco, sempre acabava me trazendo de volta e fui percebendo que a trama, a princípio simples, vai ganhando mais e mais camadas de ressonância a cada revisão.
De fato, a história que o filme efetivamente nos mostra pode ser resumida em um parágrafo, mas na abordagem gótica são sempre os detalhes que de fato importam e, não por acaso, o roteiro nem tenta esconder por muito tempo a real natureza dos personagens e do quadro geral, assim ficamos logo livres para explorar as imagens que o filme sequer precisa mostrar, apenar insinuar na nossa imaginação. Imagens das crianças crescendo solitárias em cômodos apinhados de objetos antigos, um mundo particular de subjetividades distorcidas e sentimentos tonitruantes cozinhando em fogo, dor e fúria "um amor monstruoso, que nos fará a todos monstros".
Ainda que Del Toro se traia não só nos jumpscares, mas também ao não confiar nas performances de Doug Jones e Javier Botet o suficiente para dispensar o CGI redundante, é nas sutilezas ameaçadoras de Jessica Chastain, na melancolia dos olhos de Tom Hiddleston e nos pequenos detalhes da casa pouco a pouco revelados por Mia Wasikowska que o filme triunfa e justifica quantas revisões forem necessárias para desvendar seus segredos.
Mais do que uma história gótica, Del Toro criou um microcosmo gótico que precisa ser explorado, não apenas assistido.
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